segunda-feira, 2 de maio de 2011

Recebendo Marcele Alencar em "Quando a vida fica de pernas para o ar"

Dia desses, antes mesmo de criar meu blog esbarrei com o blog da Marcele por aí. O título "Não quero merecer outro lugar" me chamou atenção e então entrei. Ao me deparar com um texto triste mas belíssimo fiquei impactada mas encantada. Vez por outra dei a voltar e sempre me deparava com textos, tristes, profundos e lindos.
O pouco da história de vida da Marcele ao qual tive acesso me fez admirá-la profundamente. A forma como expressa sua dor, a força com que segue em frente e as belas palavras de que se utiliza me fizeram virar sua fã.
Deixo agora que essa mulher incrível que encontrei pela blogsfera os encante com suas palavras e sua história como encantou à mim.
Marcele, mais uma vez, obrigada pelo texto incrível!

QUANDO A VIDA FICA DE PERNAS PARA O AR

Marcele e sua família, hoje.

Eu não acredito em acaso, mas também não acredito em destino. Não acho que a gente tá perdido no meio do caos, mas também não acho que exista uma rota programada pra cada um de nós. Eu não tenho convicções religiosas e nem entendo muito de fé, mas eu sei que depende de cada um, depende das escolhas que são feitas, dos valores que se tem e das experiências por que se passou, o rumo que damos às nossas vidas. Depende principalmente do desejo que temos de ser feliz, a despeito de tudo. É clichê demais, eu sei, mas é verdade.

Muito daquilo em que eu acreditava, muito do que eu tinha por certo na vida, muito da minha razão de existir até então, morreu numa curva da estrada, espatifou imprensada na lataria do carro em que estava meu marido Thiago, médico psiquiatra, um sorriso lindo, 28 anos, que morreu instantaneamente na manhã da quarta-feira, 20/01/2010, me deixando sozinha, aos 27 anos, com um pequeno na primeira infância e um bebê de pouco mais de um ano.

A minha vida mudou depois dessa tragédia. Eu me sentia ao meio, não tinha mais uma família inteira, não tinha mais o meu marido, o meu amor, o pai dos meus filhos, o principal provedor, o cara com quem eu contava para absolutamente tudo na vida, eu não tinha mais nada. A sensação é de que se foi atravessado por uma bala de canhão e milagrosamente ainda se estava vivo, respirando, consciente e orientado, mas sem anestésicos. É uma dor que não cabe, é uma dor que não assenta, é uma dor que não diminui e faz você ter certeza de que não vai passar.

Ter a pessoa que era seu rumo e seu norte arrancada da sua vida, assim, repentinamente, faz você olhar com outros olhos todas as mãos que são estendidas, cada abraço que é dado, cada palavra de conforto. Faz com que seja colocado em perspectiva tudo que antes era considerado problema sério, tudo que antes causava noite mal dormida, tudo que antes era motivo de lágrimas. Ante a irreversibilidade da morte, ante a impotência que se sente quando o fato é consumado, a gente percebe que tudo mais é muito pequeno, é minúsculo, é perda de tempo.

Eu repito: a vida mudou na manhã daquela quarta-feira. Eu perdi muito, me arrancaram parte do que eu era e do que eu queria ser, porque eu era mais inteira do lado dele. Destruíram uma família feliz, com fotos cheias de sorrisos e um amor-nó-cego inequívoco. Tornaram órfãs duas crianças tão pequenas que nem tiveram tempo de guardar lembranças do pai na própria mente. E, em muitas noites, trancada no banheiro em que ele deixara uma declaração de amor no espelho, com uma toalha na boca para abafar os gritos do choro convulsivo, eu me debatia por dentro querendo me convencer e suportar o nunca mais.

Foi o pior de toda a minha vida, indubitavelmente. E aí, a gente descobre que o mundo não para de rodar porque você está sofrendo, as pessoas não são mais educadas, nem os motoristas lhe dão passagem porque seu olhos estão rasos d'água, você não tem atendimento prioritário nas dezenas de repartições públicas a que precisa comparecer porque não consegue nem respirar direito. O mundo continua girando e tudo volta ao normal e o mesmo é esperado de você. E, assim, sem que você perceba, lenta e progressivamente, as lágrimas diminuem e demoram mais a cair, a respiração começa a ganhar ritmo, você volta a enxergar as cores do mundo e a desejar que dias melhores cheguem.

No momento em que a gente está sofrendo, é permitido sofrer, é valioso passar pela dor, caminhar pela estrada dela se sentindo amputado, mas é preciso olhar para frente, para o além disso, para o depois, mais cedo ou mais tarde. E é então que se chega na bifurcação do caminho, onde é dada a escolha de recomeçar ou de desabar ainda mais fundo. Nenhuma das duas escolhas é definitiva ou irreversível, mas também não são dadas garantias. Independentemente da escolha que se faz, é possível voltar de novo à bifurcação e tomar o caminho oposto. Eu escolhi recomeçar, por mim, pelos meus dois pequenos e pelo que o Thiago era. Eu escolhi ser feliz de novo a despeito dessa dor e dessa tragédia. Eu escolhi viver.

E eu sigo vivendo agora, com os caquinhos de mim colados em cola branca de baixa qualidade; às vezes pisando firme e às vezes cambaleando; muitas vezes rindo e, em algumas, ainda chorando... O que me resta agora é a certeza de uma fortaleza que eu não supunha que existisse em mim e também a convicção de que poucas coisas poderão me fazer sofrer mais do que eu já sofri. Disso tudo, decorre essa sensação de liberdade que permite arriscar sem temer a dor ou o sofrimento, porque eu já os tive e já consegui superá-los. Não me resta muito mais a fazer que não seja tentar ser feliz de novo e é exatamente por isso que eu digo sempre que estou na estrada, trazendo dois pequenos pelas mãos, buscando encontrar de novo um lugar em que eu poderei ser quem eu sou para sempre.



A lembrança da família completa

Marcele Alencar


12 comentários:

  1. Mais uma vez eu choro com os textos "dela". Ela passa um emoção e uma realidade muito grande nas palavras. Sou fã e serei fã sempre dela.
    Adoreeei tb esse espaço aqui.
    Linkarei e voltarei mais vezes...sem duvidas!
    Bjs
    Tay

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  2. A Marcele tem o dom de me emocionar tb, por isso fiz questão de ter um texto dela aqui.
    Obrigada pela visita!
    Bjos

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  3. gente...
    eu penso que não suportaria...
    e admiro a marcele por escolher o caminho da felicidade. eu, sinceramente, não sei se teria forças para escolher.

    beijoo!

    www.textoscontextos.blogspot.com

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  4. Emocionante....Há uma frase do Carlos Drummond que diz: " A dor é inevitável..mas o sofrimento é opcional"...acho que é exatamente isso que ela vive...eu desejo que siga em frente...mesmo que a dor esteja lá...

    http://cairesss.blogspot.com/

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  5. Marcele já sabe... Eu a admiro, pela força, pela resiliência, pela coragem, pela doçura, pelo filhos, pela história, mas principalmente, pelo amor que a move.
    Cinthya

    http://odivaadellas.blogspot.com

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  6. Eu admiro demais a Marcele, tb não sei se no lugar dela conseguiria suportar...

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  7. Que lindo!!! É admirável a força dessa mulher.
    Gostaria de copartilhar meu blog com vc, escrevo sobre motivação e fé. bjs:)
    http://kessiamichelle.blogspot.com/

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  8. Marcele, você é linda. Se eu pudesse te mandar uma mensagem, seria esta aqui ó:

    http://www.cartapotiguar.com.br/?p=7554

    Saudações fraternas

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  9. Estou sempre pelo blog da Marcele. Tantas vezes chorei que parece que estivemos juntas, algumas vez, dividindo a dor. É o encanto da internet. Assim, só tenho a admirar e torcer, pela felicidade dela.

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  10. E eu, então? Ah como desejo que Deus reserve dias bem melhores para ela e os meus espertos e lindos netos, a despeito de toda saudade

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  11. Li sobre a Marcele aqui no seu blog e, no início por curiosidade só, resolvi ler mais a respeito no blog dela. Estou a manhã inteira, aqui na minha sala de trabalho, lendo sobre essa pessoa e sua história. Nem a conheço, mas me sinto deveras tocada. Penso na minha família. Tive muita vontade de ter lido isso antes da semana santa, quando estive em Fortaleza. Pensei que poderia tê-la conhecido, levado o Miguel pra brincar com o Matheus e o Thomás. Enfim... Nem sei o que dizer ao certo. Oro a Deus(o que posso mais?!?!?) por ela, por eles, por toda família que precisa.
    Marcele, sua humanidade é de inspirar qualquer pessoa. Corrijo alguns pensamento que vez ou outra me vem à mente: Não quero estar em outro lugar!
    Danielle Aires

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  12. A conheci ontem através do própro blog de Marcele e como o post anterior tbm não conseguia parar de ler essa história de amor tão linda mas que infelizmente foi interrompida bruscaente. Enfim, não consigo descrever o sentimento que habita meu coração desde a noite de ontem, a vontade de ser feliz e fazer todos q estão a minha volta o mais feliz possível, enquanto há tempo...
    Ana Paula Lima

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